"Bendito é, sem sombra de dúvidas, um dos mais belos e tocantes poemas que a poetisa-maior de Divinópolis já escreveu. Nele Adélia expõ-se frágil diante da tão imediata beleza do mundo, mas forte também no que lhe aflige. A própria declamou o poema no programa "sempre um papo":
Louvado sejas Deus
meu Senhor,
porque o meu coração está cortado
a lâmina,
mas sorrio no espelho ao que,
à revelia de tudo, se promete.
Porque sou desgraçado
como um homem tangido para a
forca,
mas me lembro de uma noite na
roça,
o luar nos legumes e um grilo,
minha sombra na parede.
Louvado sejas, porque eu quero
pecar
contra o afinal sítio aprazível
dos mortos,
violar as tumbas com o arranhão
das unhas,
mas vejo Tua cabeça pendida
e escuto o galo cantar
três vezes em meu socorro.
Louvado sejas porque a vida é
horrível,
porque mais é o tempo que eu
passo recolhendo despojos,
-- velho ao fim da guerra como
uma cabra --
mas limpo os olhos e o muco do
meu nariz,
por um canteiro de grama.
Louvados sejas porque eu quero
morrer,
mas tenho medo e insisto em
esperar o prometido.
Uma vez, quando eu era menino,
abri a porta de noite,
a horta estava branca de luar
e acreditei sem nenhum
sofrimento.
Louvado sejas!
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